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Pesquisadores definem parâmetros para que engenheiros incluam mudanças do clima em projetos de infraestrutura urbana

26/05/2022

As chuvas intensas que caíram em Petrópolis mostram que as mudanças do clima são irrefutáveis

Eventos extremos, como as chuvas que arrasaram a cidade de Petrópolis (RJ) no início do ano, já são muito mais comuns do que pensam aqueles que consideram as irrefutáveis mudanças climáticas um problema para o futuro. Por isso é tão importante saber como combater e se adaptar aos desafios que trazem. Uma pesquisa realizada na Universidade Federal de Viçosa (UFV) revela que obras de infraestrutura urbana que não consideram a mudança da frequência de chuvas extremas em seus cálculos estruturais já podem estar com sua segurança comprometida. O trabalho também fornece uma metodologia para definir estes novos parâmetros através da inclusão do comportamento não estacionário em chuvas extremas, algo novo no Brasil. Além de auxiliar engenheiros projetistas, o método também poderá ajudar a defesa civil a calcular riscos iminentes de desastres em áreas vulneráveis de centros urbanos.

Gabrielle Pires é professora do Departamento de Engenharia Agrícola da UFV e orientadora da pesquisa que gerou o artigo publicado na revista científica Hydrological Sciences Journal. Ela explica que, ao calcular a estrutura de pontes, barragens ou galerias de drenagem, por exemplo, os projetistas de obras de infraestrutura consideram dados históricos de chuvas intensas. A depender do risco envolvido, admite-se que uma estrutura deverá suportar uma chuva extrema com certo período de retorno, que é o tempo de recorrência destes eventos. “Os projetos geralmente assumem condições estacionárias do clima, ou seja, presumem que um período de chuvas intensas deve voltar a ocorrer de maneira linear e calculam estruturas capazes de suportar precipitações semelhantes pelas próximas décadas”, explica Gabrielle.

O problema é que os eventos extremos não são mais lineares, nem previsíveis a longo prazo. Eles estão mais frequentes e intensos e esta condição deve se agravar com o aumento do aquecimento global. Até agora, ainda não havia, no Brasil, nenhuma metodologia que orientasse os cálculos para obras nesta nova condição climática. Fornecer esta base de cálculo que inclui o componente climático não estacionário é o grande mérito do trabalho desenvolvido pelos pesquisadores da UFV.

O artigo é fruto da dissertação de mestrado da engenheira civil Bianca Cortez. De acordo com ela, o trabalho detectou que existem tendências no decorrer das séries históricas que têm se acelerado com as mudanças no clima em algumas regiões. “Os modelos que desenvolvemos para definir os cálculos conseguiram capturar a não estacionaridade do clima, por isso conseguimos representar melhor a mudança na frequência dos eventos extremos”, diz a pesquisadora. Assim, os cálculos desenvolvidos pela equipe da UFV preveem tanto as tendências ao longo do tempo quanto identificam a insegurança de obras já realizadas e que podem estar comprometidas com as chuvas que virão em pouco tempo.

Ainda para Bianca, a metodologia proposta será útil para projetos de engenharia urbana e civil, porque ajusta os cálculos, mostrando que uma estrutura prevista para suportar chuvas que seriam previsíveis nos próximos 50 anos pode estar com capacidade saturada na metade do tempo esperado. “Com este trabalho, os projetos já podem considerar a nova metodologia para o cálculo dos períodos de retorno, avaliando a relação custo versus risco”, afirma a pesquisadora.

A orientadora Gabrielle Pires lembra que a chuva não é o único fator que influencia nos desastres urbanos. Há, ainda, a intensificação do uso e ocupação do solo, que pode gerar transtornos, mesmo para chuvas mais brandas. "Ainda assim, os parâmetros de precipitações são importantes para a prevenção, porque os agentes atmosféricos são importantes condicionantes para os desastres, como as inundações”, diz ela.

As pesquisadoras esclarecem, ainda, que a capacidade de avaliar a segurança das obras já realizadas pode ajudar a defesa civil e o poder público a criarem sistemas de alertas mais eficientes para desastres naturais, assim como em relação à solidez de uma ponte ou barragem, salvando vidas das pessoas envolvidas naquela localidade.

A professora Gabrielle espera que a metodologia criada aproxime engenheiros civis de meteorologistas e climatologistas para segurança das obras de infraestrutura, sobretudo em regiões mais vulneráveis. “As mudanças climáticas estão se acelerando, mas não precisam anunciar tragédias. Temos recursos e tecnologias capazes de promover ações adaptativas e orientar políticas públicas que evitam os desastres naturais”, lembra a pesquisadora.

No momento, a equipe da UFV está em busca de recursos para refinar os cálculos ainda mais, incluindo relevo e outros componentes, mas a metodologia proposta pela pesquisa está disponível gratuitamente no site do Grupo de Pesquisas em Climatologia Aplicada (Climap) e pode ser acessada por engenheiros e pesquisadores.

A pesquisa contou com apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)

Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil
Léa Medeiros
Divulgação Institucional

A pesquisa citada nesta matéria está alinhada ao item 11 (Cidades e comunidades sustentáveis) dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU)