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Campus Viçosa

Doutorando da UFV participa da criação de modelo computacional que prevê risco de incidência do coronavírus

05/03/2020

Wesley (terceiro à dir. - 1a fila) integra o grupo coordenado pelo prof. Silvio (último à dir.)

O estudante de doutorado em Física da UFV Wesley Cota integra um grupo de pesquisa da Universidad de Zaragoza (UZ), Espanha, que tem chamado a atenção do mundo por um trabalho que permite prever a incidência de coronavírus e, consequentemente, colaborar para melhor direcionamento dos recursos dos órgãos de saúde em medidas de controle. Wesley está fazendo doutorado sanduíche pelo PDSE/Capes no Grupo de Modelagem Teórica e Aplicada  (Group of Theoretical & Applied Modeling - GOTHAM) do Instituto de Biocomputación y Física de los Sistemas Complejos  da UZ.

Coordenado pelos professores Jesús Gómez Gardeñes (UZ) e Alex Arenas (Universitat Rovira i Virgili), o grupo desenvolveu um trabalho de modelagem computacional para predição da incidência de coronavírus na Espanha. Segundo o doutorando, o modelo utilizado pelos pesquisadores pertence a uma classe maior de modelos compartimentais conhecidos há décadas no campo da epidemiologia, e já muito estudados no Grupo de Investigação de Sistemas Complexos (GISC), do Departamento de Física da UFV, do qual o estudante faz parte.

Wesley explica que são modelos matemáticos que levam em conta o estado de cada indivíduo em relação a uma determinada doença. E exemplifica: “podemos considerar o modelo SIR, no qual as pessoas são divididas em grupos de suscetíveis (S), infectadas (I) ou recuperadas (R), e elaborar equações que descrevam como ocorre a transição de um estado ao outro. Para isso, podemos também introduzir uma estrutura que diz como ocorrem os contatos entre as pessoas por meio de uma rede complexa, mediando as possíveis interações que levem ao contágio da doença por toda população”.

O que o grupo na Espanha fez, conforme o pesquisador, foi aprimorar um modelo do tipo SIR, que incorpora dados reais de mobilidade pendular (ou recorrente) em diferentes populações. Ao saber o número de pessoas que moram em uma determinada região e quantas se deslocam diariamente para outros locais, é possível construir uma rede de mobilidade e colocar essa informação explicitamente no modelo matemático. Isso, de acordo com Wesley, gera o que se chama de “modelo orientado por dados”, aumentando seu realismo, como é feito nas previsões meteorológicas.

O doutorando da UFV conta que, levando em consideração as particularidades do coronavírus da Síndrome Respiratória Aguda Grave 2 (SARS-CoV-2), foram introduzidos mais compartimentos nesse modelo, como de pessoas expostas (E), que já foram infectadas, mas não transmitem a doença, e pessoas assintomáticas (A), que não apresentam sintomas, mas transmitem a infecção, gerando o modelo SEAIR. Esse último grupo de pessoas está sendo crucial na disseminação do coronavírus, já que são dificilmente detectadas e podem estar nesse estado por um tempo reportado de até 14 dias.

Vantagens e limitações

Ao utilizar informações oficiais do número de pessoas infectadas, dados reais de mobilidade e parâmetros epidêmicos computados a partir do surto que ocorreu na China, o modelo é capaz de estimar o risco de uma determinada população contrair a infecção devido à existência de pessoas assintomáticas. “No caso, estamos utilizando esse modelo com os dados disponíveis para a Espanha, atualizando periodicamente o mapa de risco”, destaca Wesley. De posse das estimativas, os órgãos de saúde podem aplicar medidas de controle, já esperando a possibilidade de ocorrerem aumentos súbitos do número de pessoas infectadas nesses locais.

Apesar de o estudo ter sido desenvolvido para a Espanha, o modelo pode ser exportado para outros países, desde que os dados de mobilidade estejam disponíveis. O grupo da Universidad de Zaragoza também já tem informações para outros países, como Suíça e Itália. Wesley está agora compilando os dados para o Brasil. De qualquer forma, ressalta: “é fundamental que exista um canal de comunicação oficial com as autoridades sanitárias, para que se obtenha os dados de suspeitas e confirmações da doença em nível municipal e com resolução temporal (com datas) para que possam ser incorporados de forma rápida e precisa ao modelo”.

Como todo modelo, Wesley lembra que esse também tem vantagens e limitações, que estão explicadas na página do projeto, onde estão disponíveis perguntas e respostas frequentes, em espanhol e inglês. Contudo, ele está sempre sendo adaptado para refletir melhor a situação do contágio, havendo, com isso, a possibilidade de alterar parâmetros epidemiológicos relatados em futuros estudos. A grande vantagem do modelo, segundo o pesquisador da UFV, é permitir estudar a influência do período assintomático e sua infectividade associada.

Reflexos para a UFV

Como orientador do Wesley e coordenador do GISC, onde, segundo o doutorando, ele obteve a maior parte do conhecimento aplicado para a colaboração do modelo desenvolvido na Espanha, o professor Sílvio da Costa Ferreira Júnior revela que seu sentimento é de orgulho. Ele ressalta que o grupo de Sistemas Complexos da UFV destaca-se pelo estudo de problemas teóricos avançados de complexidade e, com isso, forma estudantes cientificamente independentes com base muito sólidas. “O Wesley é um ótimo exemplo disso. Em muito pouco tempo, ele conseguiu converter os seus conhecimentos teóricos aprendidos na UFV em um problema prático de importância ímpar”, avalia.

O coordenador do GISC ressalta que os trabalhos científicos dos professores Jesus Goméz-Gardenes e Alex Arenas há muito tempo são amplamente reconhecidos no meio acadêmico. O grande diferencial do atual projeto coordenado por eles, em sua avaliação, é romper as fronteiras da academia, atraindo o interesse da sociedade civil. “Em vez de publicar um artigo científico voltado aos seus pares, a equipe priorizou a ampla divulgação com uma página web interativa e mídias tradicionais. Em um momento em que a universidade pública tem sido muito questionada por uma parte da sociedade brasileira, iniciativas como estas deveriam ser replicadas para explicitar a nossa importância para o desenvolvimento e soberania do país”.

Quanto aos reflexos que o trabalho do Wesley traz para o GISC e para a própria UFV, o professor Silvio destaca dois pontos. “O primeiro - e óbvio - é contribuir para o projeto de expansão de inserção internacional da Universidade. O segundo - e mais importante - é mostrar, mais uma vez, que a UFV possui excelência em áreas do conhecimento além daquelas ligadas às ciências agrarias, em que é notoriamente reconhecida”.

Vale destacar que o Grupo de Investigação de Sistemas Complexos, do Departamento de Física da UFV, foi fundado, em 1990, pelo professor Marcelo Lobato Martins. O grupo conta com vários subgrupos. Atualmente, são oito professores com projetos independentes e mais de 30 estudantes desenvolvendo pesquisas no grupo.

Adriana Passos

Divulgação Institucional – campus Viçosa

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