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Estudo mostra que destruição de ecossistemas está colocando em risco o agronegócio brasileiro

13/07/2021

O Brasil é o maior produtor mundial de soja, com 37% do mercado global (foto: Pixabay)

Um estudo publicado esta semana na prestigiada revista científica World Development, com a participação de pesquisadores brasileiros e estrangeiros, incluindo da UFV, afirma que o desmatamento do Cerrado e da Amazônia fez com que os produtores de soja deixassem de ganhar, em média, US$ 1.3 bilhão anualmente entre 1985 e 2012. Esse valor deve subir para mais de US$ 4 bilhões anuais até 2050, se forem consideradas as previsões de mudanças climáticas globais. As expectativas representam ameaças à economia global e à segurança alimentar. A pesquisa foi divulgada no momento em que o Brasil enfrenta sua pior seca em quase um século e o desmatamento na Amazônia também bate recordes históricos.

O Brasil possui, atualmente, 35,8 milhões de hectares cultivados com soja e é o maior produtor mundial, com 37% do mercado global. Mas o futuro lucrativo da maior commodity agrícola brasileira, responsável por sucessivos recordes de exportação, está ameaçado pelas mudanças no clima regional causadas pelo desmatamento. Para o doutorando do Programa de Pós-Graduação em Meteorologia Aplicada da UFV Gabriel Abrahão, que assina o artigo Conserving the Cerrado and Amazon biomes of Brazil protects the soy economy from damaging warming, “proteger a Amazônia e o Cerrado pode evitar as altas temperaturas que prejudicam a produtividade das lavouras”.

Mudanças regionais no clima

O trabalho enfatiza a influência das mudanças regionais ao mostrar que desmatar uma área afeta o clima de toda a região ao redor. “A remoção da vegetação natural em uma área na Amazônia ou no Cerrado aumenta muito a frequência de dias e horas muito quentes em um raio de 50 km daquela área. Esse calor extremo pode ser muito prejudicial para a cultura da soja, cuja produtividade diminui com a perda de água e a fotossíntese fica mais lenta sob essas temperaturas muito altas”, afirmou Gabriel.

Os pesquisadores calcularam que um desmatamento de 30% da vegetação natural, num raio de 50 km de uma área de cultivo de soja, faz com que a produtividade caia entre 8 e 14% devido ao calor extremo. Isso sem calcular os efeitos que o desmatamento também provoca na quantidade e na distribuição de chuvas na região, que são especialmente prejudiciais para os sistemas de safra-safrinha muito usados no Cerrado e que já foram revelados em outros estudos publicados pelo Grupo de Pesquisa em Interação Atmosfera-Biosfera da UFV. Um deles, publicado recentemente na revista Nature Communications, já demonstrou perdas agrícolas anuais de US$ 1 bilhão, associadas às reduções nas chuvas causadas pelo desmatamento. Juntas, as duas estimativas revelam os enormes impactos econômicos da destruição de ecossistemas no setor agrícola do Brasil. Segundo os autores, esses dois efeitos se amplificam, gerando perdas anuais que podem ser maiores do que US$ 4,55 bilhões anuais nas safras de soja.

Mesmo considerados isoladamente, os impactos econômicos do desmatamento que provoca calor extremo e redução das chuvas são preocupantes. “As consequências econômicas são grandes e cada vez maiores, com sérios impactos na economia global e local e na segurança alimentar. É um problema local com ramificações globais e está acontecendo em regiões tropicais em todo o mundo”, disse Rafaela Flach, da Universidade Tufts (EUA) e principal autora do estudo. Ainda segundo Rafaela, “embora os impactos globais não devam ser subestimados, os danos que a perda de ecossistemas está causando para a economia brasileira são graves”.

O método

Na pesquisa publicada esta semana, os cientistas analisaram o valor que a vegetação nativa gera, ao regular o calor extremo para a produção de soja, usando duas abordagens complementares: a receita da soja perdida com a destruição de florestas e outros ecossistemas e a receita da soja obtida com a conservação desses ecossistemas.

Para a análise focada na perda do ecossistema, eles estimaram o aumento da exposição ao calor extremo para a quantidade de vegetação que foi removida. Para a análise de conservação, os autores modelaram o valor de florestas em pé e outros ecossistemas com base na regulação estimada de calor extremo.

Em 2019, a soja constituía 49% da área agrícola brasileira e 41% da receita agrícola. Os dois novos estudos que tiveram a participação da UFV revelam que os agricultores teriam aumentado a produção ainda mais se não tivessem desmatado, o que teria mantido o calor extremo sob controle e mantido as chuvas tão necessárias.

Ainda para os autores, a ciência do clima já tem uma compreensão bem estabelecida de como o desmatamento tropical contribui para a mudança climática global por meio da emissão de carbono e da redução da capacidade das florestas do mundo de retirar mais carbono da atmosfera, mas pesquisas como estas mostram como este desmatamento tem impactos climáticos que vão além do carbono, provocando aumento imediato do calor extremo local e diminuindo as chuvas regionais e locais.

Boas notícias

Os autores ressaltam que as propriedades produtoras de soja no Brasil já vêm deixando de desmatar. “O mercado nacional e internacional de soja criou mecanismos para dificultar a comercialização de soja que esteja ligada ao desmatamento. E temos percebido cada vez menos soja sendo plantada em áreas recentemente desmatadas”, disse Gabriel. Ele explica que a maior parte do desmatamento no Brasil é feita por poucas pessoas interessadas em implementar atividades com pouco retorno econômico para o país, como o garimpo e a pecuária predatória. Por isso, para o pesquisador, “se os produtores já não vêm mais querendo desmatar para plantar soja e o desmatamento prejudica a produtividade, a soja brasileira só tem a ganhar com a conservação da nossa vegetação natural”.

Para Michael Obersteiner, coautor do estudo e diretor do Instituto de Mudanças Climáticas da Universidade de Oxford (Inglaterra), “a boa notícia é que essa é uma situação em que todos podem ganhar. O setor de soja tem uma oportunidade poderosa de reduzir esse risco, parando o desmatamento. Ao fazer isso, ele beneficia sua própria indústria – para não falar da grande contribuição para desacelerar a mudança climática global”, afirmou.

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