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Floresta Amazônia em pé é bom negócio para o Brasil

24/11/2018

O estudo atribuiu valor ao custo de destruir ou preservar cada quilômetro quadrado da Floresta

Na mesma semana em que o Governo Federal anunciou oficialmente que o desmatamento na Amazônia aumentou 39% em relação ao período anterior e atingiu o maior valor em uma década, um artigo de pesquisadores brasileiros publicado na Nature Sustainability, uma das revistas científicas de maior prestígio mundial, oferece ao país um bom motivo para repensar o assunto. O estudo quantificou uma parte dos serviços ecossistêmicos prestados pela Floresta Amazônica e indicou quantos dólares o Brasil pode perder a cada quilômetro quadrado desmatado, caso estes serviços não sejam mais prestados. E trata-se de muito, muito dinheiro.

Os ecossistemas naturais prestam, gratuitamente, vários tipos de serviços ecossistêmicos, dos quais os humanos se beneficiam. Embora alguns desses serviços, como a conservação da biodiversidade, não possam ser quantificados economicamente, outros têm um valor financeiro considerável, como, por exemplo, o controle de erosão, a prevenção de enchentes, a regulação climática, e o extrativismo de produtos naturais (borracha, madeira, frutas e sementes).

 O artigo aponta que, definitivamente, não vale a pena avançar sobre a Amazônia. O ganho financeiro em área desmatada para agricultura e pecuária não compensa a perda da riqueza que a Floresta, de pé, pode gerar ao país com os muitos serviços ecossistêmicos que gera. Considerando apenas o que a Amazônia faz pelo equilíbrio de chuvas no Brasil são mais de 420 milhões de dólares anuais, o que equivale a 35% do total da rentabilidade líquida da soja em Mato Grosso. Analisando esta conta ao contrário significa dizer que, com o desmatamento, um único estado do país perderia por ano em produtividade agrícola, meio bilhão de dólares.

Pesquisa verde e amarela

A Revista Nature Sustainability(link)trouxe uma edição especial sobre a Amazônia que inclui o artigo mencionado Dos 13 autores do artigo publicado, nove são brasileiros.“Os experimentos previstos neste estudo foram todos executados por equipes brasileiras, baseadas pincipalmente na UFV e na UFMG, mostrando a relevância de pesquisadores brasileiros nesta temática, disse Gabrielle Pires. Ela e Marcos Heil Costa, ambos professores do Departamento de Engenharia Agrícola da Universidade Federal de Viçosa, são co-autores do trabalho mais detalhado sobre precificação dos serviços ecossistêmicos fornecidos pela Floresta Amazônica já realizado até agora em todo o mundo. O estudo foi realizado em três anos e financiado pelo Banco Mundial.

Os professores explicam que o trabalho quantificou apenas uma fração do valor total da Floresta (quatro dos 17 serviços ecossistêmicos atualmente documentados). Serviços como a a produção de Castanha-do-Pará e de matéria prima a partir de madeira e borracha, mitigação do efeito estufa por meio do estoque de carbono,a regulação do clima para o agronegócio e a geração de energia hidroelétrica foram expressos com detalhes. ”Nós precificamos cada quilômetro quadrado dos seis milhões de hectares da Pan-Amazônia, mas ainda assim, o trabalho foi conservador. Alguns serviços ecossistêmicos como o turismo e a imensa biodiversidade contida na Floresta, por exemplo, não foram contabilizados por serem potenciais ainda desconhecidos em sua totalidade” disse Marcos Heil Costa.

Somando o valor dos serviços ambientais, os pesquisadores calcularam que a Floresta Amazônica, de pé, gera uma economia anual de US$ 8,2 bilhões ao ano para o Brasil. O estudo atribuiu valor ao custo de destruir ou preservar cada quilômetro quadrado da Floresta. A soma dos serviços ambientais, segundo os autores, pode chegar, em algumas áreas, a US$ 737 por hectare por ano, um valor muito superior à receita bruta gerada pela pecuária de baixa produtividade na Amazônia, normalmente inferior a US$ 400 por ha por ano.

Os pesquisadores da UFV também analisaram as perdas que o desmatamento traz à cultura da soja, à pecuária e à geração de energia elétrica, a contribuição da Amazônia para a regulação climática em todo o Brasil e na América do Sul. “Quanto mais próximo à área desmatada, maior a influência do desmatamento sobre o regime de chuvas, mas as consequências são continentais” explica Gabrielle Pires.

Sem floresta, sem chuva, sem dupla safra

Para Marcos Heil, a remoção da floresta reduz a duração da estação chuvosa, sobretudo em áreas do arco do desmatamento, formado pelos estados do Mato Grosso, Pará, Rondônia, e parte do MATOPIBA, região adjacente à Amazônia formada por parte dos estados de Maranhão Tocantins, Piauí e Bahia: “Hoje os produtores cultivam duas safras anuais, uma de soja e outra normalmente de milho. O desmatamento encurta a estação chuvosa e coloca em risco a dupla safra, comprometendo a produtividade e a produção total”. No caso da pecuária o prejuízo pode ser ainda maior. “Sendo uma atividade tipicamente de baixo uso de tecnologia e baixa rentabilidade, qualquer perda de receita pode significar a troca de um pequeno lucro por um consistente prejuízo!

O trabalho conclui que avançar sobre a floresta para obter mais espaço para o plantio pode ser uma ilusão desastrosa. “O ganho em espaço para a agropecuária não compensa as perdas econômicas causadas pela perda de floresta. É ela que garante a constância do regime de chuvas e viabiliza muitas atividades econômicas que dependem do clima no Brasil, inclusive a agricultura intensiva de Mato Grosso e MATOPIBA”, disse Heil. Para os pesquisadores, é preferível que a agricultura avance sobre as áreas de pastagem degradada da própria Amazônia e do Brasil Central, que já foram desmatadas e, por causa do manejo inadequado, hoje têm baixíssima produtividade.

O estudo usou dados de censo agropecuário, outros coletados em campo, preços de commodities agrícolas, sensoriamento remoto e modelagem para permitir diversas simulações de cenários de desmatamento. Os resultados são apresentados pela ferramenta “Desmatamento e Chuva”  na plataforma do Grupo de Pesquisa em Interação Atmosfera- Biosfera (http://www.biosfera.dea.ufv.br/dchuva) e pela plataforma AmazonEcoServices, do Centro de Sensoriamento Remoto da UFMG (https://csr.ufmg.br/amazones/). As plataformas são interativas e permitem ao usuário comum fazer simulações de perdas financeiras para cada área e para todos os serviços ambientais analisados pela pesquisa.

Políticas agrícolas

O mapeamento dos valores monetários dos serviços ecossistêmicos é essencial para a elaboração de estratégias de conservação o estabelecimento de políticas públicas de preservação e uso do solo na Amazônia, pois traz um incentivo à conciliação entre a conservação ambiental e o agronegócio.

Esta edição da Revista Nature Sustainability traz ainda um editorial alertando para a enorme pressão da expansão agrícola sobre a Floresta e outros ecossistemas como o Cerrado e a Mata Atlântica. Segundo os editores, o Brasil alcançou impressionantes êxitos ambientais, mas agora, os pesquisadores precisam dar ao novo governo evidências que apóiem políticas que ajudem o país a continuar perseguindo a sustentabilidade ambiental. “Precisamos de provas convincentes para evidenciar que os passos atrás na política ambiental de sustentabilidade não são ruins apenas para o meio ambiente, mas também para os brasileiros e para o mundo”.

Léa Medeiros

(Divulgação Institucional)

 

 

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