Campus Viçosa

Programa coloca UFV como referência nacional em saúde unificada

16/06/2015

O programa proposto por Cristina Pettan-Brewer tem coordenação informal de Luis Nero

Na última semana, mais de 60 estudantes e professores da UFV participaram de uma maratona de palestras e debates sobre temas variados, como dengue, informática na medicina, doenças em animais, problemas ambientais e autismo. Tudo isso fez parte de uma disciplina de pós-graduação muito diferente e, até então inédita, no Brasil. Os alunos e professores que participaram da disciplina especial, reconhecida pela Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-graduação, têm em comum o interesse em participar de um programa que está fazendo da UFV uma referência nacional em saúde unificada: o One Health Partnership.

O objetivo da disciplina One health: reducing risks of diseases at the animal–human-ecosystems interfaces foi reunir pesquisadores dos vários departamentos que trabalham com temas transversais de saúde. A princípio, estão participando do One Health os departamentos de Nutrição e Saúde, Medicina Veterinária, Medicina e Enfermagem, Educação Física, Biologia e Engenharia Florestal, Tecnologia de Alimentos Agronomia e Microbiologia Agrícola. Durante a semana, eles assistiram a palestras e debates de áreas pouco comuns às suas práticas cotidianas, mas o objetivo era mesmo o de reuni-los para saber o que têm em comum e como podem trabalhar juntos em prol da saúde integral do homem, do meio ambiente e dos animais.

Para entender melhor a mistura de áreas tão diversas, é preciso voltar a 2012 e conhecer uma personagem central para o fato de a UFV está servindo de modelo para a América Latina. Christina Pettan-Brewer formou-se em Medicina Veterinária na UFV, em 1988, e foi para os Estados Unidos em busca de oportunidades de trabalho. Tornou-se professora da Universidade de Washington, em Seattle, sempre trabalhando com medicina comparada e doenças infecciosas.

Em dezembro de 2012, ela voltou a Viçosa para a festa de 25 anos de formatura e soube que a UFV tinha um curso de Medicina. Foi então que procurou os dirigentes da UFV para apresentar o trabalho que realiza nos EUA com o conceito de One Health. “A saúde integral é um conceito muito antigo, que existe desde o século XIX, mas que se perdeu com a excessiva especialização que desintegrou os grupos que trabalhavam de forma integrada em torno de um tema”, explica a professora. Ela conta que surtos de doenças emergentes de grande alcance mundial acabaram reunindo as associações de médicos e veterinários nos Estados Unidos para pesquisas e ações conjuntas para combater as doenças, a partir de 2007.

O trabalho atraiu outros profissionais, como dentistas, antropólogos e estatísticos popularizando o conceito de One Health em várias partes do mundo, a partir de 2010. “Um exemplo foi o trabalho dos antropólogos no combate ao vírus Ebola. O conhecimento de que os povos nativos tinham o hábito de se abraçar durante períodos de luto foi fundamental para compreender a disseminação da doença e determinar ações de combate ao contágio que envolvia a mudança de hábitos culturais”, conta Cristina, referindo-se à doença que matou mais de oito mil pessoas em todo mundo.

One Health na UFV

experiência da ex-aluna foi imediatamente acatada pela administração da UFV, por meio da Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação. Segundo ela, “One Health não é apenas pesquisa. Na UFV, nós começamos pela pesquisa porque tivemos o apoio da administração e sensibilizamos professores dos programas de pós-graduação em Veterinária, Engenharia de Alimentos e Nutrição compartilhando pesquisas e interesses em prol da saúde unificada”.

De volta aos Estados Unidos, a professora Cristina buscou apoio em universidades estrangeiras para promover o intercâmbio de pesquisadores da UFV interessados no conceito de One Health. Nesse período, a reitora Nilda de Fátima Ferreira Soares esteve nos Estados Unidos para incrementar algumas parcerias e acabou promovendo o primeiro programa de due degree (dupla titulação) de uma universidade americana (Washington State University) com uma universidade brasileira. “Os programas de pós-graduação americano e brasileiros são diferentes, mas nós conseguimos fazer com que os estudantes de doutorado da UFV ganhassem a dupla titulação ao cursar disciplinas nas universidades do estado de Washington”, conta a reitora.

Em dois anos, pelos menos cinco pesquisadores, entre alunos de doutorado e professores, foram para os Estados Unidos ou para a Austrália por meio das parcerias de colaboração firmadas pelo programa One Health. A diferença é que este programa inclui pesquisas duradouras, ou seja, os interessados têm que se adaptar às pesquisas em andamento e dar continuidade a elas estudando vários aspectos de um mesmo tema, ou de aspectos transversais à saúde integral. “O pesquisador pode ser engenheiro florestal ou zootecnista que estude as interações do solo ou de animais com a saúde. Um pesquisador de artes pode trabalhar com autismo em parceria com pesquisadores da microbiota intestinal. Mas eles têm que participar de pesquisas que continuam mesmo depois de uma tese ser defendida”, explica a professora Cristina, que está na UFV desde o mês de março.

Em sua permanência no campus Viçosa, ela se empenhou em organizar a disciplina especial da pós-graduação e buscou apoio em vários departamentos. Isso porque, desde 2014, é embaixadora do Fulbright Program para promoção da saúde integrada na América Latina. “Submeti a proposta e ganhei esta bolsa para iniciar o programa na América Latina e escolhi começar por Viçosa, por conhecer bem esta Universidade onde estudei”, conta a professora.

Em maio deste ano, Cristina representou o Brasil na One Health Global Conference 2015, em Madri (Espanha). O evento reuniu pesquisadores de 40 países e apresentou o Brasil e a Universidade Federal de Viçosa como referência do projeto na América Latina. “Já temos outras universidades interessadas em participar, mas a UFV será o modelo que queremos disseminar. Vamos criar os centros de referência em One Health e, quem sabe, fazer com que a próxima conferência mundial aconteça no Brasil”.

Na UFV, o Programa conta com o apoio do professor Luis Augusto Nero, do Departamento de Veterinária, que tem agido como seu coordenador informal, e da coordenadora do programa de pós-graduação em Nutrição e Saúde, professora Josefina Bressan, além de vários outros professores que já estão trabalhando de forma integrada.

“São perspectivas que ainda não existem e uma oportunidade de trabalhar em colaboração com outras universidades para descobrir formas de controle e tratamentos para doenças emergentes em todo o mundo. É uma oportunidade rara e muito boa e nós precisamos intensificar nossa participação”, disse o professor Nero. Ele lembra que a parceria também cria redes de cooperação internacional muito positivas para os pesquisadores e oportunidades alternativas de financiamento. “É uma oportunidade imperdível para nossos alunos e para o doutorado, que vai formar profissionais capacitados para compreender e tratar a saúde de maneira integral”, disse a reitora da UFV, comemorando o fato de a UFV ter se tornado modelo para o conceito de One Health na América Latina.

 

 

(Léa Medeiros)